quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O Homem de Olhos Vermelhos (parte V)

Rasga as cartas e fotografias
espalhadas por todo armário.
Bota para fora toda a comida
ao ler os versos do seu diário.

Magnetiza a angústia ao escolher
o sabonete que sempre recorda
os dias de um passado distante
perdidos no vão de cada porta

fechada atrás de si mesmo.
O sofrimento não incomoda,
não tanto quanto o desprezo
que por si sentira outrora.

Mas os cortes já conseguiram
fazer da pele algo mais forte.
A vontade é apenas uma:
não depender mais de sorte.

domingo, 17 de novembro de 2013

O Homem de Olhos Vermelhos (parte IV)

Emergem das paredes manchadas
os quadros que retratam a loucura
de um ser em constante mudança,
de uma alma que detém a própria cura.

As unhas já estão aparadas
cortado o cabelo, barba cuidada.
Sapatos engraxados com zelo
mostram a fragilidade terna e acuada

vivida em ambos os lados:
em prantos, em tela e por dentro.
As calças rasgadas muito contrastam
com a cena em tal desalento.

O olhos se abrem uma vez
na profunda luz do meio-dia.
O homem sentado no quadro
é tão real quanto sua fantasia.

O Homem de Olhos Vermelhos (parte III)

Surge uma folha na janela,
o vento carrega-a, precioso.
Os laços que rodeiam as mãos
uma vez estiveram em seu pescoço.

A grama se cobre de verde,
o líquido evapora por si só.
As chaves no trinco da porta
se mexem barulhentas espalhando pó.

Mas o medo é sempre forte atrativo,
centro de gravidade imenso.
Enrijecem-se os músculos fracos
para mais uma vez o tormento

voltar a tomar conta do ar.
Os pássaros voam ao longe
na terra distante de fora.
Olha pra lá, pergunta "pra onde?".

O Homem de Olhos Vermelhos (parte II)

Não estão feridas as mãos
mas doem como luvas afiadas.
Há vinho pelos cantos no chão
somado às mágoas salgadas

em formas de lágrimas vis
vindas do fundo do poço.
Onde estará aquela beleza?
O sorriso daquele moço

envelhecido pela desesperança,
findado pela forte agonia.
Está certamente escondido
numa esquina em que uma sinfonia

executa uma obra sublime
regida pelo melhor dos maestros.
Quem sabe se encontre novamente
o que foi bom e todo o resto.

sábado, 16 de novembro de 2013

O Homem de Olhos Vermelhos (parte I)

Pergunta-se porque corre
ao encontro da maré.
Se nem entende o que pensa
se nem sabe quem é.

Estuda a batida do relógio
as horas que passam sombrias.
Alimenta o medo do escuro
em suas declarações vazias.

Arde em suor e pranto
do abandono de ser abandonado.
O foco está sempre na dor
que faz estada ao seu lado.

Não derrama lágrima
muito menos esboça sorriso.
Apenas vê seu próprio sangue
escorrendo por todo piso.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Olhares Cruzados

Por que possuis minha mente
se nem sabes que o faz?
O que tens em teus lábios
que sempre me atrai?

O que olhas ao longe
quando miro teu olhar?
Meu horizonte tão distante
como o teu, bem para lá...

Pergunto-me se imaginas
se ao menos devaneia
o meu profundo pensamento 
que em ti faz aldeia

cabana, morada e lar.
Certamente não o faz
Mas quiçá algum momento
venha a ti o que me traz

de volta aquela vontade
que dispara adrenalina
dentro do meu ser.
Ah, será que imaginas?

De dúvidas estou completo
De vontades, explodindo
Mesmo em segredo
Saibas que estou indo

de encontro às amarras
que prendem toda força
de dizer-te que o que mais quero
é beijar a tua boca!

Peças e Pétalas

As peças derramam suas cores amargas
iludidas pelos sabores opacos do nada.
Iluminam-se então as dores.
Por todos os cantos, rumores
de que não sobreviverá à alvorada.

Sorrateiramente se esguia a bela flor.
Despetalada não consegue reconhecer o odor
que refresca a memória branda
e faz renascer por onde anda
as peças que já não mais sentiam calor.

Enlaçam-se em correntes de penas
as peças, a flor e as cenas
de ternura que jamais se poderia ver.

Em um quebra-cabeça se encaixam.
Novas pétalas nascem e se acham
perdidas onde sempre quiseram se perder.